O domínio holandês no Nordeste do País no século XVII (um dos períodos mais estudados da história brasileira) é o enredo de Babilônia Tropical, que estreia no CCBB São Paulo, depois de temporadas nas praças de Belo Horizonte, Brasília e Rio de Janeiro. As apresentações acontecem de 06 de outubro a 19 de novembro de 2023, quintas e sextas, às 19h; sábados, domingos e feriados (12/10 e 02/11), às 17h. Os ingressos custam R$30 (inteira) e R$15 (meia-entrada) e podem ser adquiridos na bilheteria do CCBB SP ou pelo site www.bb.com.br/cultura.
O grupo de quatro atores, inspirado no episódio da invasão holandesa em Pernambuco – quando a região era a maior produtora de açúcar do mundo – ensaia o espetáculo que mescla passado e presente e se desenrola a partir da tentativa de reproduzir o momento em que Anna Paes, dona de engenho da época, escreve um bilhete para o aristocrata neerlandês Maurício de Nassau, presenteando-o com seis caixas de açúcar em sua chegada ao Brasil. O bilhete está guardado até hoje no Arquivo Nacional dos Países Baixos, em Haia.
Anna Paes, uma mulher considerada à frente de seu tempo, já que sabia ler e escrever (algo raro para a época), assumiu também a administração de um dos maiores engenhos de Pernambuco com a morte do marido. Valores positivos para esse início de modernidade, como liberdade e emancipação, vão sendo desmontados, revelando a grande farsa do projeto que deu início a esse empreendimento açucareiro, que só existiu graças à escravidão.
O idealizador, dramaturgo e diretor da obra, Marcos Damigo, enfatiza: “É uma responsabilidade imensa dar vida às pessoas que vieram antes de nós, para que possamos transformar a forma como nos enxergamos e, assim, talvez, ativar nossa sensibilidade para uma melhor compreensão de nós mesmos.”
O produtor do espetáculo, Gabriel Bortolini, adianta que a peça provoca reflexões profundas. “A representação histórica, exemplificada pela personagem Anna Paes, reflete nossas escolhas sobre como perpetuar a história, a imagem e seus pares. A história brasileira foi feita de brancos para brancos. Aqui, questionamos não apenas os reconhecimentos em si, mas também seus privilégios e as barreiras que precisam ser superadas para alcançar um lugar diferente”, afirma Bortolini.
Com sucesso de público e crítica em sua estreia em Belo Horizonte/MG, o espetáculo tem “cenas que revelam lugares mais oblíquos do racismo, justamente por parte daquelas personagens que se vêem como artistas ‘antirracistas'”, afirma a crítica Júlia Guimarães no site Horizonte da Cena.
“Tem sido interessante ver como o espetáculo toca as pessoas de maneiras tão diferentes, dependendo de onde você se situa em relação às questões que emergem em cena”, conta o diretor Marcos Damigo. Para a temporada paulista, as expectativas são positivas: “A peça traz uma diversidade de olhares, provocando o espectador o tempo inteiro, com a busca de um teatro mais contemporâneo e desconstruído”, complementa.
A atriz Carol Duarte, que interpreta o papel de Anna Paes, destaca a importância de abordar a barbárie histórica do país. E ressalta: “como podemos olhar para o passado sem reparar que os pilares desse país foram sustentados pela escravidão? Os vilões da nossa história devem ser nomeados para que, no presente, possamos erradicar qualquer indício dessa herança escravocrata, restaurando o lugar devido para aqueles que foram capturados e para aqueles que ainda são oprimidos”, afirma a atriz.
O elenco tem os atores Ermi Panzo, artista angolano radicado há quase dez anos no Brasil, que também assina a dramaturgia da obra; Jamile Cazumbá, artista baiana que transita pelo audiovisual e a performance; e Leonardo Ventura, ator consagrado em obras dirigidas por Antunes Filho no Centro de Pesquisa Teatral; além de Adriano Salhab, que assina a direção musical do espetáculo e executa a trilha sonora ao vivo em cena, com músicas originais.
Destacando-se tanto na atuação quanto na dramaturgia, o ator e poeta Ermi Panzo explora a reconstrução desse período para revelar a existência do racismo como herança da escravidão, e suas implicações nos modos de nos relacionarmos com a própria ideia do trabalho. “A obra traz uma representação vívida do cenário dinâmico do trabalho da época, que resulta em um conjunto de elementos que caracterizam a precariedade das condições de vida do trabalhador, atentando contra sua dignidade, especialmente para a maioria negra”, explica Panzo.
A permanência do racismo em todas as relações também é um dos destaques que a peça traz para a atriz Jamile Cazumbá. Ela destaca que sua personagem experimenta “cotidianamente os danos, a violência e as perversidades do racismo, e de todas e diversas categorias de subalternidades estabelecidas socialmente e politicamente para que meu corpo habite”, e que a peça “é uma tentativa de abrirmos mão da suposta ingenuidade que o romantismo colonial insiste em coreografar”.
Babilônia Tropical oferece ao público uma experiência rica e instigante, com música ao vivo e recursos audiovisuais, utilizando desde imagens de arquivos históricos até filmagens realizadas em estúdio por uma equipe audiovisual, com imagens de grande impacto e beleza. “Enfrentamos, aqui, a questão central diante do teatro contemporâneo: a chegada de temáticas antes ocultas ou apagadas que demandam novos engendramentos, tanto de relações formais, quanto de relações profissionais e pessoais; e a despeito de qualquer resposta, encontramos no caminho da escuta, da contracena e do acolhimento, nosso modo de relacionarmo-nos com tudo isso e uns com os outros; que o teatro seja canal para toda essa elaboração e que a cena possa cumprir o seu papel primordial, que é o da síntese poética”, adianta Leonardo Ventura, ator.
O projeto recebeu apoio da Embaixada dos Países Baixos para o desenvolvimento da dramaturgia, o que possibilitou uma viagem do autor Marcos Damigo a Pernambuco, bem como a participação do historiador Daniel Breda no processo de pesquisa, além de uma primeira imersão com o elenco da peça em 2022.
A peça estreou no CCBB Belo Horizonte, depois teve temporadas pelo CCBB Brasília e pelo CCBB Rio de Janeiro.
SINOPSE
Um bilhete escrito por uma mulher em Pernambuco no início do século XVII está guardado até hoje no Arquivo Nacional dos Países Baixos. Nele, Anna Paes, uma dona de engenho descendente de portugueses, presenteia Maurício de Nassau com seis caixas de açúcar branco, assim que ele chega para governar o que era na época o Brasil holandês, em 1637. A vida dessa mulher se torna objeto de investigação de um grupo de artistas de teatro. Mas, conforme os intérpretes investigam o contexto em que esse bilhete foi escrito, emergem questões de classe, gênero e raça, revelando que o passado talvez não esteja tão remoto assim.
FICHA TÉCNICA
Marcos Damigo – idealização, concepção e direção geral
Gabriel Bortolini – concepção e direção de produção
Ermi Panzo e Marcos Damigo – dramaturgia
Carol Duarte, Jamile Cazumbá, Ermi Panzo e Leonardo Ventura – elenco
Lúcia Bronstein e Sol Miranda – interlocução artística
Adriano Salhab – direção musical, composição e música ao vivo
Simone Mina – direção de arte
Wagner Pinto – iluminação
Glaucia Verena – preparação vocal e consultoria artística e dramatúrgica
Pat Bergantin – preparação corporal
Daniel Breda – consultoria histórica
Rafa Saraiva e Mila Cavalcanti – programação visual
Coletivo Corpo Sobre Tela/Ricardo Aleixo e Julia Zakia – direção de fotografia Coletivo Corpo Sobre Tela – montagem e finalização de cor
Rafael Tenório – vídeo engenho em chamas
Luiz Schiavinato Valente – coordenação de redes sociais
Mayara Santana e Rafael Tenório – design para redes sociais
Jackeline Stefanski Bernardes e Ví Silva – assistência de direção
Luiz Schiavinato Valente e Ví Silva – assistência de produção
Rick Nagash – assistência de direção de arte
Vinicius Cardoso – assistência de cenografia
Amanda Pilla B e Hellige Sant’Anna – assistência de figurino e adereços
Carina Tavares – assistência de iluminação
Wanderley Wagner e Fernando Zimolo – cenotécnica cenário
Mauro José da Silva e Matheus Kaue Justino da Silva – cenotécnica filmagem Vivona – cabeleireira elenco
Julia Zakia – making off
Luiza Zakia Leblanc – câmera adicional making off
SERVIÇO
Babilônia Tropical – A Nostalgia do Açúcar
Temporada: de 06 de outubro a 19 de novembro de 2023, sempre de quinta a domingo
Horário: quinta e sexta às 19 horas, sábado, domingo e feriados (12/10 e 02/11) às 17h
Local: Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo – CCBB SP
Endereço: Rua Álvares Penteado, 112 – Centro Histórico – SP
Próximo à estação São Bento do Metrô
Duração: 80 minutos
Recomendação: 14 anos
Ingressos: R$30 (inteira) / R$15,00 (meia-entrada)
Vendas: bilheteria do CCBB SP ou pelo site bb.com.br/cultura
Informações: bb.com.br/cultura | (11) 4297-0600 | Redes Sociais: instagram.com/Ccbbsp | facebook.com/ccbbsp | twitter.com/ccbb_sp | @oficcinamultimedia
CCBB SP – Aberto todos os dias, das 9h às 20h, exceto às terças.
Estacionamento conveniado: Rua da Consolação, 228, com traslado gratuito até o CCBB. Parada no Metrô República no trajeto de volta. Consulte horário de funcionamento em nossas redes sociais.
R$14 pelo período de 6 horas (necessário validar o ticket na bilheteria do CCBB).