Pensar em como a realidade virtual pode ser incorporada ao campo artístico foi uma das ideias que inspirou a diretora Janaína Leite em seu novo trabalho, “Deeper”. Trata-se de uma instalação com codireção de Ultra Martini e concebida em parceria com a artista visual Leandra Espírito Santo que propicia uma experiência imersiva híbrida, mesclando a presença física e uma vivência 3D completamente digital. A obra faz sua estreia no Itaú Cultural (Av. Paulista, 149), com sessões a cada trinta minutos, a partir das 11h, entre os dias 5 e 10 de março de 2024.
A partir desse tripé, artes cênicas, artes visuais e tecnologia, a obra transita entre os territórios da loucura, do sonho e da morte, sejam nas suas dimensões acidentais, sejam induzidos a partir dos estudos sobre psicodelia. Esses estados revelam uma extensa plasticidade do que hoje entendemos por consciência e parece ressoar também na investigação sobre as tecnologias utilizadas na realidade virtual.
O mundo digital está cada vez mais intensamente presente nas nossas vidas e gera mudanças significativas na subjetividade humana, já que as fronteiras entre o mundo físico e o virtual estão sendo borradas.
“O que nos interessa é a possibilidade de pensar a ‘dissociação’ como paradigma de subjetivação do qual ainda não podemos prever as consequências: uma vida entre mundos, entre a realidade e a ficção, entre a pessoa e as suas representações virtuais através de seus avatares. Tudo isso parece ser um campo fértil para as linguagens artísticas em suas múltiplas hibridizações”, explica Janaína no projeto.
Sobre a instalação
O público tem até 60 minutos, entre a entrada e a imersão com óculos 3D, para desfrutar dessa iniciativa que explora diversos estados do corpo e da mente. “Como estar com os óculos de realidade virtual perturba bastante os sentidos, é possível experimentar novas sensações sem correr nenhum risco real. Dá até para simular quedas. Inclusive, na área da Psiquiatria, por exemplo, têm acontecido algumas ações com pessoas que têm fobias”, conta Janaína.
A proposta de “Deeper” é produzir a dissociação entre o corpo físico e o corpo virtual, explorando e questionando as fronteiras do corpo em situações limite. Quem embarcar nessa jornada transita por câmaras e corredores repletos de provocações sobre vida, morte e pornografia – elementos bastante presentes nas criações de Janaína Leite.
Na sala denominada “Glory Hole”, por exemplo, concebida por André Medeiros Martins com a participação de 12 performers, os espectadores entram em contato com fetiches diversos. Já no espaço onde se lê nas paredes digitais “I am my own laboratory”, o público experimenta, sob o ponto de vista em primeira pessoa, uma cena de suspensão corporal.
Completam a equipe multidisciplinar Renato Navarro (desenho de som), Marcos Vinicius (desenho de luz) e Flávio Barollo (criação audiovisual com inteligência artificial). A convite da Edinburgh Fringe Society como parte da iniciativa Voices from the South e contemplados pelo edital “Arte no Metaverso” do Itaú Cultural, os artistas, em parceria com Rafael Steinhauser como dramaturgue e a plataforma anitya.space, conceberam esse projeto, unindo teatro e tecnologia digital.
Sobre a plataforma anitya.space e Deeper
Os espaços virtuais de “Deeper” foram criados na plataforma anitya.space por Conrado Andrade e Vitor Milagres, possibilitando a experiência imersiva 3D da peça. Além disso, por conta da ação de Pedro Jardim, um dos fundadores da ferramenta, e um grande time, o trabalho pôde alcançar o público.
“Quando Janaína Leite e Rafael Steinhauser nos procuraram para integrar a plataforma imersiva anitya na construção da peça de teatro Deeper, percebemos a oportunidade de demonstrar a capacidade e potencial das experiências imersivas no mundo das artes. Já temos experiências imersivas aplicadas com realidade virtual e realidade aumentada no metaverso em várias áreas, incluindo games (onde nasceu originalmente), educação, desenhos e projetos industriais e profissionais. Agora, com Deeper, mostramos que pode também ser usada em artes cênicas”, explica Pedro Jardim, CEO da anitya.
“Cocriamos vários elementos na construção dos mundos (espaços) pelos quais o público transitará, incluindo objetos, dinâmicas, sons imersivos, que não eram parte da ferramenta original anitya. Tivemos que desenvolver a solução do zero para poder ser incorporada na peça teatral. Pedro Jardim, CEO da anitya.
A experiência consiste em um circuito de realidade virtual no qual o espectador caminha por diversas salas assistindo e interagindo dramaturgicamente com as multimídias alocadas no espaço virtual. Cada sala tem o intuito de provocar no público sensações diferentes, definidas a partir da pesquisa da equipe de criação de Deeper acerca de reações do corpo e da mente em situações extremas.
A pesquisa também abrange o deslocamento do aspecto mental virtual e do corpo físico. Nesse sentido, o VR é interessante pois dá ao público a liberdade de escolher por onde caminhar, olhar e interagir, sempre direcionado (guiado) pela própria arquitetura virtual e pelo roteiro da peça.
Percurso criativo
A curiosidade pelas potencialidades do universo virtual no campo das artes começou durante o confinamento decorrente da pandemia de Covid-19. Com os espetáculos teatrais se aventurando pelas plataformas digitais, Janaina Leite, em parceria com André Medeiros Martins, Lara Duarte e Ultra Martini, convidaram diversos artistas para investigar as dramaturgias do corpo e da presença mediadas unicamente pelo espaço digital.
Foi uma ampla pesquisa que resultou nas experiências “Peça” (prêmio APCA de melhor espetáculo online), espetáculo documental idealizado por Marat Descartes e dirigido por Leite; “Camming 101 noites”, que joga com a estrutura de trabalho das “camgirls”; e o pornoshow “O armário Normando”, em que o público era convidado a transitar por salas virtuais com performances pornográficas interativas.
Seguindo essa linha da sexualidade, no espetáculo presencial “História do Olho – um conto de fadas porno-noir”, a partir da obra de Georges Bataille, as questões apresentadas anteriormente são ampliadas ao serem trabalhadas as práticas fetichistas e a body art no limite entre a estética e o ritual.
Agora, em “Deeper”, acontece uma união de todos esses elementos tão caros à Janaína Leite: arte e vida, teatro e pornografia, corpo e virtualidade. “Acredito que a obra seja bem legal para se pensar em novas maneiras de se fazer teatro, em uma união diferente com o audiovisual e com a tecnologia”, afirma a diretora.
Com produção da Corpo Rastreado, a obra se apresentou em 2023 e início de 2024 no formato de work in process no Festival de Edimburgo, na Escócia; no Festival Santiago a Mil, no Chile, e no Festival Mix Brasil, em São Paulo.
Sinopse
“Deeper” é uma experiência imersiva que une arte e realidade 3D, para explorar e questionar o corpo e a consciência em situações limite. Os territórios da loucura, do sexo, da psicodelia e da proximidade com a morte, mostram uma extensa plasticidade do que hoje entendemos por consciência humana, o que acontece também na investigação sobre as tecnologias que utilizam a realidade virtual. O projeto lança hipóteses sobre uma nova linguagem, que tem na dissociação entre corpo físico e corpo virtual, espaço real e espaço digital, potencialidades inexploradas. A experiência acontece principalmente através de óculos 3D e conta com instalação da artista visual Leandra Espírito Santo.
Ficha técnica
Concepção, direção e pesquisa – Janaina Leite
Codireção e concepção sonora – Ultra Martini
Dramaturgia – André Medeiros Martins, Janaina Leite, Lara Duarte, Ultra Martini
Texto – Lara Duarte
Gravação e edição de vídeo – Vic Von Poser
Assistência audiovisual – Júlia Rô, André Voulgaris, Matheus Brant
Música original e desenho de som – Renato Navarro
Dramaturgue – Rafael Steinhauser
Criações audiovisuais com inteligência artificial – Flávio Barollo
Projeto “Fetiches” – de André Medeiros Martins
Performers – Acácio Abreu, Bel Six, Carlos Jordão, David Medrado, Dom Barbudo, Fernando Brutto, Georgia Vitrilis, Imacullado, Joe, Pamkada, Pombo Morcego, Darktitah
Suspensão corporal – Darktitah, Pombo Morcego e Pamkada
Equipe anitya.space
Conrado Andrade – líder de desenvolvimento
Vitor Milagres – designer 3D e visualidade
Miguel Medeiros – designer 3D
Kelso Fujimoto – designer de jogos
Pedro Jardim – coordenação geral
Instalação “Cena Oca #1”
Concepção e realização – Leandra Espírito Santo
Assistente artístico e projeto 3D – Francisco Soares
Desenho de luz e sistema de câmera de segurança – Marcus Vinícius
Consultoria e Coordenação Técnica VR – Robson Catalunha
Assessoria de imprensa – Canal Aberto – Márcia Marques, Daniele Valério e Flávia Fontes Oliveira
Designer gráfico – Samuel Alves de Jesus
Produção – Corpo Rastreado – Ariane Cuminale, Gabi Gonçalves e Fernando Pivotto
Colaboração – André Fischer, Lucas Maximiano, Rodrigo Salles, Rui Afonso, Gabriel Saito.
Núcleo de pesquisa “Fundo” – Ery Gabixi Caozito Baesse, Lívia Machado,
Lucas Guilherme Sollar, Lucas Miyazaki, Thais Della Costa, Robs Wagner, Caíque Andreotti e Felipe Thaça
Palestrantes: Lyara Oliveira e Zaika dos Santos
Plataforma de experiência imersiva 3D – anitya.space
Realização – Itaú Cultural
Produção – Corpo Rastreado
Co-Produção – Olhares Instituto Cultural – Fernando Braun
Apoio – Edinburgh Fringe Festival, Voices From The South, Fundação Teatro a Mil e Festival Mix Brasil
Agradecimentos: Casa da Xiclet, EBAC Online, Grupo XIX de Teatro
SERVIÇO
De 5 a 10 de março de 2024
Horários das sessões:
Dia 5: às 11h, 11h30, 12h, 15h, 15h30, 16h, 19h, 19h30, 20h
Dia 6: às 11h, 11h30, 12h, 19h, 19h30, 20h
Dia 7: às 11h, 11h30, 12h, 15h, 15h30, 16h, 19h, 19h30, 20h
Dia 8: às 15h, 15h30, 16h, 19h, 19h30, 20h
Dia 9: às 12h, 15h, 15h30, 16h, 19h, 19h30, 20h
Lotação: 10 lugares por sessão
* Este trabalho faz uso de óculos de realidade virtual. Certifique-se de que você não tem nenhuma restrição quanto ao uso deste dispositivo. Não recomendado para pessoas com labirintite.
Classificação indicativa: 18 anos
Duração: até 60 minutos
Entrada gratuita: retirada de ingressos presencial, mediante comprovação de 18 anos. As bilheterias estarão abertas 1h antes de cada sessão.
Itaú Cultural – Sala Multiuso – 2º andar
Avenida Paulista, 149, próximo à estação Brigadeiro do metrô
De terça-feira a sábado, das 11h às 20h. Domingos e feriados 11h às 19h
Informações: pelo telefone (11) 2168.1777 e wapp (11) 9 6383 1663
E-mail: atendimento@itaucultural.org.br
Acesso para pessoas com deficiência física
Estacionamento: entrada pela Rua Leôncio de Carvalho, 108.
Com manobrista e seguro, gratuito para bicicletas.
www.itaucultural.org.br
www.twitter.com/itaucultural
www.facebook.com/itaucultural
www.youtube.com/itaucultural
Material de apoio – Minibios
Janaina Leite é atriz, diretora, dramaturga e pós-doutoranda pela Escola de Comunicação e Artes da USP. É referência na cena brasileira para a pesquisa dos “teatros do real” com trabalhos premiados como “Stabat Mater” (prêmio Shell de dramaturgia em 2020), Camming 101 noites” e “História do Olho – um conto de fadas porno noir”, pesquisando a relação entre teatro e ponografia. Mais recentemente, se interessa especialmente por linguagens híbridas, a perspectiva ob-scena que aproxima teatro e performance, arte e vida, fronteiras difusas entre práticas artísticas e práticas socio-culturais. Seu trabalho vem atraindo interesse fora do Brasil e já esteve como convidada em países tais quais França, Espanha, Portugal, Chile, México e Alemanha. https://www.janainaleite.com.br/
Ultra Martini é formado em Artes Cênicas pela UNB – Universidade de Brasília. É ator, diretor, humorista e compositor. Participou do projeto Palco Giratório, do Sesc, com o espetáculo “Stanisloves-me” (2016), criação de Ultra Martini e Simone Reis. Em 2017, estreou seu espetáculo “Ab-reação” – criação e direção. Com a peça “Stanisloves-me” ganhou o Prêmio Sesc do Teatro Candango (DF) de Melhor Sonoplastia (2018), além de ter sido indicado como “Melhor Atriz”, com “Entre-quartos”(2016), “Copo de Leite” (2017) e “Stanisloves-me” (2018). Fez direção musical e foi ator do espetáculo “Decadenta” (2016), dirigido por Felícia Johansson.
Leandra Espírito Santo é artista visual e desenvolve trabalhos híbridos a partir de meios como escultura, instalação, vídeo, fotografia. Em sua produção, vem refletindo sobre a relação entre corpo e tecnologias, permeada pelo universo das redes sociais. É doutora e mestra em Artes Visuais pela Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA/ USP), e graduada em Comunicação Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF/ Niterói, RJ). Em 2023, produziu obra inédita para o espetáculo “Autorretrato”, dirigido por Felipe Hirsch, realizou a exposição “Disponível” no Museu de Arte Contemporânea de Niterói, e integrou pelo segundo ano a comissão de seleção e curadoria do Parque de Esculturas da Secult Espírito Santo.
André Medeiros Martins é ator e pornografo. Graduado em Teatro e licenciado em Arte Educação pela Universidade Anhembi Morumbi. É o organizador dos livros “Flexões – um estudo sobre a sexualidade plural” – lançado pela NVersos Editora em 2011 e “Vulgar” em 2021. Diretor dos longas-metragens “Alfredo não gosta de despedidas”, vencedor do Prêmio Susy Capo no Festival Mix Brasil e “Alfabeto Sexual”, selecionados para os festivais internacionais Queer Lisboa e PopPorn Berlim, entre outros.
Lara Duarte é performer e dramaturga. Mestra em Artes da Cena pela UNICAMP com a pesquisa “Compêndio de decomposições dramatúrgicas: Por uma dramaturgia monstra”. Bacharela em artes cênicas pela UFBA – Universidade Federal da Bahia, bolsista PIBIC com a pesquisa “A escrita falada: dramaturgia da contação de história”. Formada em dramaturgia pela SP Escola de Teatro. Autora do livro “Gambiarras Sentimentais” pela editora Patuá e libretista no atelier lírico do Theatro São Pedro.
Histórico de criação da obra Deeper
Deeper – O corpo material e imaterial em suas borderlines
A obra “Deeper”, pensada como uma experiência imersiva híbrida entre presença e realidade virtual a partir do tema dos limites do corpo e da consciência, une arte e tecnologia, virtualidade e presença em um projeto inédito e multidisciplinar de criação estética. Longe de ser um trabalho episódico, “Deeper” dá continuidade a uma pesquisa que vem há anos lidando com o tema do limite ao trabalhar arte e vida, teatro e pornografia, corpo e virtualidade.
O interesse pelo universo virtual que está na base do projeto começou nos anos de confinamento pandêmico, quando Janaina Leite, em parceria com André Medeiros Martins, Lara Duarte e Ultra Martini, convidam uma série de artistas para explorar as possíveis dramaturgias do corpo e presença mediadas unicamente pelo espaço digital. A investigação resultou em experiências significativas como “Peça” (prêmio Apca de melhor espetáculo online), “Camming 101 noites” e Pornoshows “O armário Normando”. Os dois últimos, não à toa, tinham a pornografia como mote, e traziam já o corpo e a presença de forma radical alimentados por uma linguagem que já habitava a internet muito antes da contingência pandêmica.
Por outro lado, a criação do espetáculo “História do Olho – um conto de fadas porno-noir” aproxima os artistas da obra de Georges Bataille que tem no sexo e na morte seus temas principais. O espetáculo explora a pornografia, as práticas fetichistas e a body art no limite entre a estética e o ritual, tendo seu ápice na cena de suspensão corporal apresentada ao vivo no espetáculo e que, agora, recebe uma versão digital 360 graus na obra “Deeper”.
A convite da Edinburgh Fringe Society como parte da iniciativa Voices from the South e contemplados pelo edital “Arte no Metaverso” do Itaú Cultural, os artistas, em parceria com Rafael Steinhauser como dramaturgue e Pedro Jardim da anitya.space concebem o projeto de uma obra imersiva 3D une teatro e tecnologia digital para pensar o corpo material e imaterial no limiar da consciência.
O projeto, com produção da Corpo Rastreado, se apresentou em 2023 e início de 2024 no formato de work in process no Festival de Edimburgo, na Escócia, no Festival Santiago a Mil no Chile e no Festival Mix Brasil em São Paulo, e faz agora sua estréia no Itaú Cultural de 05 a 10 de março de 2024.