Em ‘Casamento de Sangue em Santos’, o Grupo Tescom coloca em cena temas como as disputas territoriais e a brutalidade dos desejos, tendo como pano de fundo a sociedade do final da década de 1970 – sintomaticamente semelhante com os dias atuais. Seja pelo conservadorismo (na obra, representado por um casamento arranjado), pelos conceitos impostos por uma família tradicional (ser recatada e do lar) ou por uma sociedade que condena, o espetáculo suscita a discussão a respeito da mulher que, mesmo nos dias atuais, não pode viver plenamente o seu desejo. A montagem será apresentada entre os dias 4 e 12 de fevereiro, aos sábados às 20h e aos domingos às 19h, no Teatro de Contêiner Mugunzá.
Com elenco composto por Alex Felix, Ana Paula Silva, Flávia Simões, Isabela Soares, Júlia Norato, Karla Lacerda, Marcelo Marinho, Marco França, Pedro
Norato, Ronaldo Fernandes e Vinicius Oliveira, o espetáculo conta com a direção de Nelson Baskerville, que partiu de uma memória pessoal para dar o pontapé inicial na montagem da peça.
“Sempre busco contextualizar a obra com o tempo de agora e quando fui convidado para dirigir o espetáculo lembrei de uma cena que aconteceu na praia de Santos em 1978, onde uma mulher foi agredida por fazer topless. Não encontramos registros dessa ocorrência, mas ela segue viva na minha memória, me fazendo perceber o que a sociedade pode fazer com que aquele que ela entende como minorias. Isso se reflete na sociedade de agora, com números alarmantes de violências e feminicídios”, pontua o diretor Nelson Baskerville.
Gestado antes da pandemia de Covid-19, em um momento em que o Brasil começava a flertar com o conservadorismo e com a agenda de costumes do então governo de Jair Bolsonaro, a obra traz consigo reflexos das restrições de liberdade ocorridas no período da ditadura militar, em especial a violência contra a mulher. Além disso, Casamento de Sangue em Santos expõe os papéis sociais, nos quais os indivíduos têm seu comportamento ditado pelo meio no qual estão inseridos.
“Começamos a ensaiar após a vacina, mas o texto “Bodas de Sangue”, de Federico García Lorca, já estava sendo estudado e adaptado pelo grupo desde o início de 2020. Fica nítido que mesmo com o passar dos anos, a sociedade segue tirando o poder de escolha das mulheres e que isso tem impactos em diversas áreas”, enfatiza o dramaturgo Ronaldo Fernandes.
O espetáculo aborda também outras temáticas, como as questões das disputas de terra e o surgimento dos movimentos sociais que ampliaram suas bandeiras de luta para abarcar também as reivindicações feministas em Santos e em outras regiões do País. Em tempos de tantos retrocessos e do aumento da violência contra a mulher, a obra segue atual e é uma exposição, denúncia e alerta.
“Este trabalho é um marco na carreira do Tescom. Depois de 25 anos de existência e resistência do grupo, poder trabalhar com um grande diretor como o Nelson Baskerville, santista como a gente, e fazer um espetáculo que se situa em Santos, mas ao mesmo tempo é universal, é um prazer para nós enquanto coletivo”, ressalta Karla Lacerda, uma das fundadoras do Tescom.
Pedro Norato, outro fundador do grupo, também destaca a relevância da obra: “Por mais que se baseie em um texto do García Lorca, escrito no início do século passado, é impressionante o quanto muitas problemáticas descritas ali ainda se repetem hoje. Cada nova apresentação é um convite à reflexão constante, tanto por parte do público quanto por nossa parte. O espetáculo é uma tragédia e a tragédia serve para nos alertar, enquanto seres humanos, sobre aquilo que temos o poder de fazer nas nossas vidas”.
Após a temporada em São Paulo, o espetáculo circulará ainda em São José dos Campos (ABC Paulista), Mongaguá e Santos (Baixada Santista). O projeto foi contemplado pelo Programa de Ação Cultural, da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo (Proac Edital Expresso 02/2022).
Sobre o Grupo Tescom
O Grupo de teatro TESCOM é um grupo profissional da cidade de Santos, oriundo do Grupo Teatral “Uma Mão Com Mel” fundado por Iracema Paula Ribeiro, tendo o início de sua carreira em 1976. Na década de 90, Iracema Paula Ribeiro, Pedro Norato e Karla Lacerda, com o intuito de ampliar a visão do grupo, fundam o TESCOM com o propósito de compartilhar os estudos do grupo com a comunidade.
Após o falecimento de Iracema, Karla e Pedro continuaram com os projetos teatrais e recriaram essa essência do grupo na escola de artistas e técnicos, oferecendo cursos e oficinas artísticas, tendo o teatro como carro chefe. Criam também o pioneiro FESCETE – Festival de Cenas Teatrais, um dos festivais mais importantes culturalmente para a região da Baixada Santista e que se estende a outras cidades com o passar dos anos.
Em tempos de tantos retrocessos e do aumento da violência contra a mulher, a obra segue atual e é uma exposição, denúncia e alerta. Foto: Lairton Carvalho
Sinopse “Casamento de Sangue em Santos”
“Essa é a história de uma mulher que se casou e já no mesmo dia fugiu e abandonou o marido. Acabou ficando viúva do que não amava e viúva também do que amou.”
Em 1978, duas famílias ricas e proprietárias de terras negociam o casamento de seus filhos para que assim possam ampliar o domínio pelas terras da região. Porém a noiva, uma mulher sufocada pela paixão, só pensa em outro, Leonardo, um homem pobre e movido apenas pelos instintos, mas que tem uma grande riqueza: é dono do pedacinho de terra de onde vem a água. O casamento, que era para ser negócio lucrativo, acaba virando uma tragédia.
Ficha Técnica
Produção: Grupo Tescom de Teatro
Direção: Nelson Baskerville
Adaptação: Alex Felix, Marcelo Marinho, Nelson Baskerville e Ronaldo Fernandes.
Elenco: Alex Felix, Ana Paula Silva, Flávia Simões, Isabela Soares, Júlia Norato, Karla Lacerda, Marcelo Marinho, Marco França, Pedro
Norato, Ronaldo Fernandes e Vinicius Oliveira.
Serviço
Casamento de Sangue em Santos – Grupo Tescom
Teatro do Contêiner Mugunzá – Rua dos Gusmões, 43 – Santa Ifigênia – São Paulo/SP
Dias 4,5,11 e 12 de fevereiro – Sábados, às 20h e Domingos às 19h
Duração: 80 minutos | Classificação: 14 Anos
Ingresso: Gratuito – Retirada de ingresso nos locais das apresentações