O descarte inadequado de óleo de cozinha é um problema silencioso que gera impactos significativos tanto na infraestrutura de saneamento quanto no meio ambiente, mas ainda é pouco discutido pela população. No Brasil, o consumo de óleos vegetais ultrapassa os três bilhões de litros por ano, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). Desse volume, estima-se que mais de 700 milhões de litros sejam descartados de maneira imprópria, geralmente em pias e ralos domésticos, contribuindo para um problema generalizado.
Sibylle Muller, engenheira civil especialista em saneamento e fundadora da NeoAcqua, destaca que o óleo de cozinha, ao ser descartado incorretamente, causa danos nas redes de esgoto. “O óleo de cozinha não se dissolve em água e, quando despejado nos ralos, adere às paredes das tubulações, formando camadas que se misturam com outros resíduos e podem causar entupimentos, tanto nas tubulações dentro das edificações, quanto nas redes de coleta de esgotos”, explica Muller.
Um dos principais pontos de preocupação é o impacto nas redes de esgoto antes que o óleo alcance as Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs). Nessas estações, o óleo deve ser removido da água antes que ela seja devolvida aos rios. Contudo, quando o óleo é descartado incorretamente nas tubulações domésticas, ele pode causar danos até chegar à estação. Além disso, se o esgoto não passar por uma ETE, o óleo pode atingir rios, lagos e canais, onde cria uma camada superficial que impede a troca de gases entre a água e a atmosfera, prejudicando os ecossistemas aquáticos.
Quando o óleo é descartado diretamente no solo, os efeitos são igualmente prejudiciais. “No solo, o óleo penetra e pode afetar a qualidade da água subterrânea, que é uma fonte vital de abastecimento em muitas regiões, além de poder afetar a oxigenação e a permeabilidade do solo, prejudicando o desenvolvimento das plantas”, explica Muller.
Estudos da SABESP indicam que um único litro de óleo de cozinha pode contaminar até 20 mil litros de água, revelando a seriedade dos problemas ambientais que podem ser causados pelo seu descarte inadequado, com impactos diretos na qualidade dos recursos hídricos, essenciais para a sobrevivência humana.
A reciclagem de óleo de cozinha no Brasil ainda é muito limitada. Dados de 2019 da Abiove e do IBGE mostram que, embora o consumo tenha atingido 4,7 bilhões de litros naquele ano, apenas 108 milhões de litros foram devidamente coletados e reciclados, o que representa menos de 10% do potencial de reaproveitamento.
“Isso é muito pouco, considerando que o óleo reciclado, além de minimizar a contaminação das águas e do solo, pode ser transformado e aproveitado em biodiesel, sabão e outros produtos úteis”, afirma Muller. Ela enfatiza a importância de campanhas educativas para incentivar o descarte correto do óleo, que deve ser armazenado em garrafas plásticas e entregue em pontos de coleta, como supermercados e associações de reciclagem. “Com um gesto simples, as pessoas podem evitar danos ambientais graves e contribuir para a economia circular”, reforça.
Além dos impactos ambientais, Muller chama a atenção para os custos econômicos gerados pelo descarte inadequado. “A manutenção das redes de esgoto entupidas pelo óleo representa um custo elevado para o poder público e para os consumidores, que precisam pagar por serviços de desentupimento. Se aumentássemos a coleta e a reciclagem, esses custos poderiam ser reduzidos drasticamente”, conclui a especialista.
A conscientização e a adoção de práticas sustentáveis são fundamentais para reduzir os impactos negativos do óleo de cozinha. Cada litro de óleo reciclado contribui para a preservação dos recursos naturais e para a criação de um ambiente mais saudável para todos.