Apesar de o excesso de velocidade estar entre as principais causas de acidentes nas rodovias federais brasileiras, a fiscalização com radares móveis caiu pela metade no ano passado, na comparação com 2019, ano em que o governo federal determinou a suspensão das fiscalizações com estes equipamentos nas rodovias federais de todo Brasil.
Segundo dados disponibilizados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), em 2019 foram registradas 41.610 horas de fiscalização. Apesar de a Justiça determinar o retorno das fiscalizações, em 2020 os equipamentos funcionaram por 15.250 horas e, em 2021, por 19.885 horas.
Para fiscalizar os 75,8 mil km de malha rodoviária federal, a PRF possui hoje 242 radares portáteis e 115 radares fixos em funcionamento. Os equipamentos móveis podem ser usados em 1.050 trechos, considerados críticos em estudos técnicos e análise de dados feitos pela instituição. Embora não haja um número mínimo de radares por trecho de rodovia, já se provou à exaustão que estes equipamentos salvam vidas.
O excesso de velocidade causa acidentes de trânsito mais graves e letais. “Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), um aumento de 20% na velocidade média do veículo amplia em 30% as colisões fatais. O controle da velocidade de tráfego por meio de radares é uma ação que reduz o número de sinistros de trânsito e também a gravidade e letalidade de ferimentos decorrentes desses eventos evitáveis”, afirma o diretor científico da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra), Alysson Coimbra.
Suspensão e retorno
Em agosto de 2019 o governo federal suspendeu o uso de todos radares móveis nas fiscalizações nas rodovias federais. Após ação do Ministério Público Federal (MPF). Os radares móveis só voltaram a ação em dezembro, depois que a Justiça determinou a retomada das fiscalizações. No entanto, desde então, o tempo de fiscalização caiu drasticamente.
Causas definidas
No ano passado, segundo dados da PRF, 6.742 acidentes foram causados por motoristas que dirigiam em velocidade incompatível com a estabelecida na rodovia. A principal causa de sinistros foi a reação tardia ou ineficiente do condutor, com 6.902 ocorrências. “Quando se dirige a uma velocidade incompatível, o motorista tem um tempo de reação menor ou, pior ainda, pode sofrer um sinistro mais grave ao tentar escapar de uma situação de risco, como um obstáculo súbito, por exemplo. Os limites de velocidade em uma rua, avenida ou estrada são estabelecidos com critérios técnicos que levam em consideração o traçado, fluxo e conservação da via, e os índices de acidentalidade na área. A revisão periódica das estatísticas do trânsito é o mais valioso instrumento para o ajuste dessas intervenções que reduzem a insegurança viária”, completa o especialista.
Recomendação da ONU
Coimbra cita que os países mais desenvolvidos do mundo caminham no sentido oposto: reforçam a fiscalização e trabalham para reduzir os limites de velocidade nas ruas e avenidas. Esta é, inclusive, uma das recomendações da Conferência Global da ONU sobre Segurança no Trânsito para a redução das mortes. “Aqui no Brasil, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) comprovaram, em 2019, que a quantidade de sinistros é baixa em um raio de até 50 metros perto de um radar. Quando a distância do equipamento é ampliada, aumenta também a quantidade de acidentes. A ciência nos mostra o caminho: precisamos ampliar a fiscalização com radares fixos e móveis para coibir o excesso de velocidade e reduzir as mortes no trânsito brasileiro”, enfatiza o diretor científico da Ammetra.
Estudos científicos
O que não faltam são estudos para comprovar a necessidade e a importância de reduzir e monitorar a velocidade nas ruas e rodovias. Segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a chance de um pedestre morrer é de 10% se o veículo estiver transitando em até 30 km\h. Se a velocidade for ampliada para 50 km\h, a probabilidade passa dos 80%.
O estudo The handbook of road safety measures, do pesquisador norueguês Rune Elvik, mostrou que a presença dos radares reduziu pela metade o número de acidentes e até 20% o número de mortes. “Mais que reduzir imediatamente o número dos sinistros de trânsito decorrentes do excesso de velocidade, estudos internacionais, como o feito pela Insurance Institute for Highway Safety (IIHS), mostraram que a instalação de radares mudou o comportamento dos motoristas em longo prazo. Enquanto ainda perdermos tempo acreditando que os radares existam para alimentar uma ‘indústria da multa’, permitiremos que os infratores sigam se beneficiando dessa falácia e colocando em risco a nossa integridade física e a daqueles que amamos”, finaliza Coimbra.