De que maneira um texto escrito por um sueco no século 19 pode se relacionar aos dias de hoje? Com isso em mente, o coletivo Damas Produções criou o espetáculo Senhora X, Senhorita Y, uma paráfrase do clássico de August Strindberg (1849-1912) “A Mais Forte”, publicado em 1889.
A peça faz uma circulação gratuita pelos teatros municipais Décio de Almeida Prado (CCD), Zanoni Ferrite, Arthur Azevedo, Flávio Império e Cacilda Becker, além da Oficina Cultural Oswald de Andrade, entre os dias 9 de março e 30 de abril de 2023. O grupo também oferece debates sobre os temas abordados pela peça e uma oficina sobre o processo de criação do espetáculo (confira a programação completa abaixo). Esta circulação tem prevista 24 apresentações do espetáculo, atividades formativas e, como encerramento, a exibição da versão audiovisual do espetáculo no dia 4 de maio, quinta, às 19h30. As ações – todas com entrada franca – foram contempladas pela 15ª Edição do Prêmio Zé Renato – Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo.
Na trama original, duas mulheres “competem” pelo mesmo homem. Em uma casa de chá, às vésperas do Natal, a esposa encontra a suposta amante do marido em uma mesa e trata de verbalizar todo o seu descontentamento. A outra não pode se expressar. “Para Strindberg, a personagem casada é a mais forte, pois, mesmo traída, ela conseguiu superar isso e sustentar o lar”, conta Camila Couto, performer sonora do espetáculo.
Descontentes com essa construção teatral, a companhia Damas Produções expandiu o texto, questionando os papéis historicamente assumidos pelas mulheres na sociedade contemporânea. Assim, em Senhora X, Senhorita Y, a personagem calada ganha voz.
Uma construção coletiva
No palco, duas forças se contrapõem. De um lado, estão os padrões de comportamento feminino impostos pela sociedade – neste caso, a boa esposa, bela recatada e do lar, representada pela Senhora X. Do outro, a busca pela própria identidade e o desejo de romper essas amarras e ser independente: a Senhorita Y exemplifica essas inquietações.
Os espectadores, então, acompanham esse caleidoscópio de mulheres em uma sobreposição retórica de vozes. A ideia é colocá-las em cena sem julgamentos, abrindo espaço para a pluralidade de pensamentos. “É um jogo muito performativo. As atrizes Ana Paula Lopez e Sol Faganello transitam tanto entre papéis quanto entre si mesmas. Ou seja, tem momentos em que a voz é das atrizes e não das personagens”, detalha Camila.
Para além disso, o grupo propõe outro desafio ao Strindberg: o padrão da heteronormatividade foi rompido e o corpo lésbico entra para a cena. “Nós olhamos para o texto e entendemos que não queríamos montá-lo como o clássico. Nosso desejo era partir dele para questionar e revelar essas múltiplas vozes femininas que temos hoje em dia. Todos os embates que tivemos na sala de ensaio reverberaram na nossa dramaturgia”, explica Sol.
Dessa forma, os escritos de Strindberg aparecem como ecos em Senhora X, Senhorita Y. As atrizes Ana Paula Lopez e Sol Faganello improvisam a partir de eixos temáticos evocados por A Mais Forte. O ritmo do espetáculo também é construído ao vivo pela performer sonora Camila Couto, que empresta sua voz e suas composições para o trabalho, tornando-se também uma personagem. Nesta triangulação acontece no espetáculo sob a direção de Silvana Garcia, que também assina a dramaturgia.
“Todo o texto, mesmo que tenha uma certa condução dramatúrgica minha e até cenas especificamente construídas por mim, teve como base o trabalho de improvisação das atrizes”, comenta Silvana.
As cenas são costuradas com um humor ácido, debochado e ingênuo, uma marca do coletivo Damas Produções. Para o grupo, o riso aumenta a dimensão do problema, alertando o público para aquilo contra o qual devemos lutar. “O riso também é uma forma de nos identificarmos e nos desidentificarmos com as personagens rapidamente, de um jeito escorregadio”, afirma Ana Paula.
Oficina
Para complementar toda essa experiência, as artistas da companhia ainda realizam uma oficina sobre o processo de criação do espetáculo. Trata-se de um encontro com duração de quatro horas que acontece em cada um dos teatros pelos quais a peça circula.
A oficina é dedicada a artistas, atrizes e atores, artistas da dança e da performance, não-artistas, estudantes e pessoas interessadas em geral. São 20 vagas para pessoas acima de 16 anos. É possível se inscrever neste link aqui.
Sinopse
Sob o pretexto de representar a peça A Mais Forte, de August Strindberg, duas atrizes e uma performer sonora se lançam em um jogo pelo qual intercambiam diversos papéis, explorando, com humor ácido, as construções heteronormativas do feminino sugeridas pelo texto. Indo mais longe: elas desafiam o autor sueco pela exposição de um disparador imprevisto: o corpo lésbico reivindicando o protagonismo da cena. O que diria Strindberg disso tudo?
Ficha Técnica do espetáculo
Direção geral e dramaturgia: Silvana Garcia
Elenco: Ana Paula Lopez, Sol Faganello e Camila Couto
Texto: Silvana Garcia, Ana Paula Lopez e Sol Faganello
Performance e dramaturgia sonora: Camila Couto
Direção de movimento: Ana Paula Lopez
Direção de arte: Sol Faganello
Iluminação: Sarah Salgado
Operação de luz: GIVVA e Jessica Catharine
Costureira: Silvana Carvalho
Design gráfico: Natalia Sayuri
Fotografia do espetáculo: Maria Fanchin
Produção audiovisual: Sol Faganello
Mídias digitais: Camila Couto
Articulação territorial: Ana Elisa Mello e Samya Enes (Cotiara Produtora)
Direção de produção: Sol Faganello
Gestão cultural: Camila Couto
Produção: Damas Produções
Assessoria de Imprensa: Canal Aberto Comunicação | Márcia Marques
Ficha Técnica da versão audiovisual do espetáculo
Direção Geral e Dramaturgia: Silvana Garcia
Direção Audiovisual: Sol Faganello
Elenco: Ana Paula Lopez, Sol Faganello e Camila Couto
Texto e Roteiro: Silvana Garcia, Ana Paula Lopez e Sol Faganello
Elenco: Ana Paula Lopez, Sol Faganello e Camila Couto
Dramaturgia Sonora: Camila Couto
Direção de Movimento: Ana Paula Lopez
Direção de Arte: Sol Faganello
Performance Sonora e Operação de Som: Camila Couto
Concepção e Operação de Luz: Sarah Salgado
Direção de Fotografia: Vitor Vieira
Operação de Câmera: Vitor Vieira e Camila Picolo
Captação de Som: Eric Vasconcelos
Edição de vídeo e teaser: Sol Faganello
Assistência de edição: Camila Couto
Edição e mixagem de som: Daniele Dantas
Transmissão: Dita Produtora
Produção Audiovisual: Dita Produtora
Produção e Realização: Damas Produções
Serviço
Espetáculo
Senhora X, Senhorita Y
Duração: 60 minutos
Classificação: 12 anos
TEATRO ZANONI FERRITE
23, 24, 25 e 28 de março, de quinta a sábado, às 20h, e, na terça, às 20h
Endereço: Av. Renata, 163 – Vila Formosa
Ingresso: gratuito – retirar na bilheteria uma hora antes do espetáculo*
Após a apresentação do dia 24 de março, está programado um bate-papo
TEATRO ARTHUR AZEVEDO (SALA MULTIUSO)
6 a 9 de abril, de quinta a sábado, às 20h, e, no domingo, às 18h
Endereço: Av. Paes de Barros, 955 – Alto da Mooca
Ingresso: gratuito – retirar na bilheteria uma hora antes do espetáculo
*Após a apresentação do dia 9 de abril, está programado um bate-papo
OFICINA CULTURAL OSWALD DE ANDRADE
11 a 14 de abril, de terça a sexta, às 20h
Endereço: R. Três Rios, 363 – Bom Retiro
Ingresso: gratuito – retirar na bilheteria uma hora antes do espetáculo
*Após a apresentação do dia 14 de abril, está programado um bate-papo
TEATRO FLÁVIO IMPÉRIO
20 a 23 de abril, de quinta e sexta, às 21h, no sábado, às 20h, e, no domingo às 19h
Endereço: R. Prof. Alves Pedroso, 600 – Cangaíba
Ingresso: gratuito – retirar na bilheteria uma hora antes do espetáculo
*Após a apresentação do dia 23 de abril, está programado um bate-papo
TEATRO CACILDA BECKER
27 a 30 de abril, de quinta a sábado, às 21h, e, no domingo, às 19h
Endereço: R. Tito, 295 – Lapa
Ingresso: gratuito – retirar na bilheteria uma hora antes do espetáculo
*Após a apresentação do dia 30 de abril, está programado um bate-papo
Exibição da versão audiovisual
* CINECLUBE SENHORA X, SENHORITA Y
4 de maio, quinta, às 19h30
Local: Oficina Cultural Oswald de Andrade
Exibição da adaptação audiovisual + bate-papo + transmissão no YouTube da Damas