Nas últimas semanas, a Rússia anunciou a parada completa do fornecimento de gás para Europa, com o fechamento do gasoduto Nord Stream 2, que leva gás natural desde 2011, dobrando a capacidade anual da linha Nord Stream para 110 bilhões de metros cúbicos e passando pela Alemanha e Mar Báltico. Com isso, espera-se que os outros países retirem as restrições feitas após a invasão da Ucrânia. Mas será que é só isso?
Para Daniel Toledo, advogado que atua na área do Direito Internacional, fundador da Toledo e Associados e sócio do LeeToledo PLLC, escritório de advocacia internacional com unidades no Brasil e nos Estados Unidos, é preciso olhar de maneira mais ampla para o cenário.
“Particularmente, eu acho que é um ato impensado da Rússia, porque nós ainda estamos no verão. Vamos supor que a Rússia quisesse realmente pressionar para fazer a retirada das restrições, seja lá pela razão que for… Eles vão fazer isso ainda no verão? E ainda tem o outono, para depois o inverno. Então, o que eles querem? A retirada das restrições agora? Por que agora? Se fosse realmente usado como moeda de troca pelo desespero, eles esperariam pelo menos o outono até o inverno. O clima vai estar bem mais frio e os europeus vão sentir mais, realmente, e seria uma pressão maior para retirada das restrições”, aponta.
Mas outra questão que as pessoas não estão comentando é que foi publicado pela União Europeia que muitos dos países já estão com mais de 80% do estoque de gases suficientes para passar o inverno inteiro, e aqueles que não estão já possuem contatos com outros países para fornecimento de gás no estado gasoso (os Estados Unidos estão mandando muitos navios e cargas de gás em estado líquido). “Então, por que a Rússia está fazendo isso agora? É falta de estratégia ou desespero? Porque neste momento não vai gerar caos, não vai gerar calamidade, nem nada… A não ser que eles tenham a intenção de ter outra reação ou conflito em algum desses países que são fornecedores de gás. Pode ser uma estratégia mal pensada ou pode ser uma estratégia de conflito em outro lugar”, alerta.
Vale lembrar que as sanções impostas à Rússia por conta do conflito vêm de governos dos Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Japão e membros da União Europeia (UE), incluindo uma série de medidas que afetaram os meios de transporte, as transações financeiras e a distribuição de combustíveis e alimentos. Essas restrições vão desde a exclusão de bancos russos do Swift (sistema global de pagamentos) até aquelas que envolvem a família de Vladimir Putin.
Os cortes impostos pela Rússia, no entanto, podem gerar impactos em todo o mundo. “Toda vez que a gente enxerga uma estratégia de crise, há possibilidade de ganho, seja em investimento em alguns assets, seja algum tipo de previsão que possa fazer e já possa realizar algum estoque para se proteger ou ainda evitar uma alta de preços – porque, sem dúvida, se isso se solidificar no final do outono e começo do inverno, teremos uma alta dos preços de gás em vários lugares, principalmente na Europa”, completa o especialista.
Isso porque a soma de cortes de fornecimento, sanções e conflitos diplomáticos podem instaurar uma verdadeira crise energética nos países europeus.