O índice de famílias endividadas no Brasil chegou a 78,5% em junho deste ano, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada mensalmente pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). O percentual representa um aumento de 0,2%, em comparação aos meses de fevereiro a maio, período em que o indicador se manteve estável em 78,3%. A alta alcançou o seu maior nível em seis meses.
A pesquisa, que conta com a participação de aproximadamente 18 mil consumidores de todas as capitais brasileiras, revela ainda que, do total de consumidores com dívidas em atraso, 4 em cada 10 afirmam não ter condições de pagar os compromissos de meses anteriores, maior proporção desde agosto de 2021. Outro dado do estudo aponta que a cada 100 consumidores, 46 possuem dívidas atrasadas há mais de três meses.
Na intenção de quitar as dívidas mais altas, como as do rotativo do cartão de crédito, e driblar os juros elevados, o levantamento mostra que muitos endividados têm recorrido ao crédito pessoal, já que os juros dessa modalidade tiveram queda de oito pontos percentuais, chegando a 40,9% ao ano, em média.
Para André Massaro, coordenador do Grupo de Excelência em Administração Financeira – GEAF, do Conselho Regional de Administração de São Paulo – CRA-SP, utilizar o crédito pessoal para pagar dívidas pode ser uma boa alternativa, pelo fato de ser um tipo de endividamento mais barato. “Em finanças, essa alternativa é conhecida como reestruturação de dívidas, ou seja, pegar uma dívida mais barata para pagar uma dívida mais cara. Essa estratégia é super válida para pessoas e empresas que queiram reduzir o custo da dívida”, explica Massaro.
Modalidades de dívida mais usadas
De acordo com a Peic, os consumidores usaram mais cartão de crédito neste ano, em comparação a junho de 2022, e também o crédito pessoal. Do total de famílias endividadas, 87% têm dívidas no cartão de crédito; e 9,5% com o crédito pessoal. Embora muitos brasileiros tenham a tendência de enxergar a modalidade de crédito como um grande vilão financeiro, na opinião do coordenador do GEAF, o recurso é uma excelente opção de pagamento, além de ser uma das modalidades mais convenientes para fazer a gestão financeira. Além disso, ele é um tipo de empréstimo que não cobra juros até a data de pagamento da parcela, o que o torna um aliado na organização das finanças.
No entanto, Massaro explica que o cartão deixa de ser um benefício no momento em que o consumidor passa a utilizá-lo como ferramenta de crédito de longo prazo e entra no rotativo. “A pessoa que entra no rotativo, ou seja, que não paga a fatura integralmente, vai ter no cartão de crédito um inimigo”, esclarece.
O coordenador do GEAF relembra que em 2017, o Banco Central mudou as regras para o uso do rotativo do cartão de crédito, justamente para que as dívidas não virassem uma bola de neve. Os clientes passaram a ter restrições ao fazer o pagamento mínimo da fatura e acessar o crédito rotativo. A partir da criação dessa regra, quem opta pelo pagamento mínimo da fatura não poderá fazer essa opção por vários meses consecutivos.
“Hoje o rotativo é limitado a 30 dias, se o usuário não conseguir pagar a dívida nesse período, o banco ou a instituição financeira é obrigada a oferecer outra opção de parcelamento com juros mais baratos. Com isso, a pessoa não fica mais indefinidamente no rotativo, o que é mais seguro para ela. Atualmente, a possibilidade da dívida descontrolar de forma acelerada já é bem reduzida, porque se criou uma regra para impedir isso”, explica Massaro.
Uso consciente dos recursos financeiros
Massaro alerta para o fato de o Brasil ser um país com cobranças de juros muito elevados. Um bom exemplo, é a taxa média de juros do cartão de crédito rotativo que chegou a 455,1% ao ano, em maio deste ano, o maior nível desde março de 2017. “Tal fato pode fazer com que a dívida saia rapidamente do controle”, considera.
Por este motivo, o coordenador do GEAF recomenda que a pessoa faça dívidas apenas em situações estritamente necessárias, porque o endividamento acaba tendo um custo relativamente alto. “Fazer uma dívida para algo supérfluo pode comprometer o crédito, caso apareça uma necessidade real. Também é válido que as pessoas se certifiquem de que têm recursos para pagar essas dívidas, porque, às vezes, elas tomam dívidas no desespero de resolver algum problema pontual, mas não pensam se depois vão ter condição de pagar aquela dívida, naquela condição de parcelamento e com isso a vida financeira vira um caos. O ideal é que ao utilizar o cartão, ela registre os gastos como se fosse um extrato bancário paralelo e, assim, conseguirá organizar o fluxo de caixa pessoal”, conclui Massaro.