O Brasil está no topo da lista de países com maior número de casos de depressão e ansiedade durante a pandemia de Covid-19, de acordo com um estudo conduzido pela Universidade de São Paulo (USP) em 11 países. Trabalhar em meio à tensão gerada pelo aumento no número de casos da doença, pelo distanciamento social e pelas muitas incertezas econômicas, sociais e sanitárias tem sido um desafio para a maior parte dos brasileiros. Esse tipo de cenário contribui de forma significativa para elevar um outro índice preocupante: o de acidentes de trabalho.
De acordo com a psicóloga e professora do curso de Psicologia da Universidade Positivo (UP), Janete Knapik, estados emocionais alterados influenciam negativamente a realização das atividades do cotidiano. “Os estados emocionais estão diretamente envolvidos no processo de pensamento e execução de uma ação. A carga de trabalho emocional e cognitiva podem elevar a probabilidade de que as emoções, em especial as negativas, produzam pensamentos que não estão relacionados com o trabalho que está sendo feito. Esse fenômeno tende a reduzir os níveis gerais de atenção, o que, por sua vez, aumenta a probabilidade de acidentes”, explica.
O estresse gerado pela pandemia atinge todas as classes sociais e profissionais, não importa qual é a profissão exercida. Por isso, todos os trabalhadores têm mais chance de sofrer acidentes neste período pandêmico. Janete ressalta que alguns estudos já demonstraram que emoções como a raiva podem ser um fator decisivo para que pessoas dirijam de forma perigosa, além de elevar os riscos de colisão no trânsito. “Isso pode ser considerado para outras funções. Por exemplo, quando se usa um produto químico para limpeza, estados emocionais como raiva, tristeza, euforia, entre outros, podem elevar o número de acidentes no trabalho porque a capacidade de atenção está reduzida”, destaca a especialista.
Prevenção é uma das formas de lidar com riscos
Para evitar que acidentes aconteçam, prevenir ainda é uma das saídas mais efetivas. Por isso, o Brasil tem alguns dispositivos legais que garantem ao trabalhador condições mínimas de atenção médica. Um desses dispositivos é o Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT). A criação de um SESMT é uma exigência da Norma Regulamentadora (NR) nº 4, criada pelo antigo Ministério do Trabalho e atualmente revisada pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho. Essa NR define que qualquer empresa com mais de cem trabalhadores cuja atividade seja de grau de risco 3 – por exemplo, limpeza de prédios e domicílios, imunização e controle de pragas urbanas e demais atividades de limpeza – precisa ter um SESMT constituído.
“A atuação do SESMT é fundamental para reduzir as chances de que acidentes de trabalho ocorram. E, quanto mais conectados às questões específicas da pandemia eles estiverem, melhor”, avalia o Engenheiro de Segurança do Trabalho do SESMT Coletivo Facop, Maycon Vieira. Oficializado em 2013, o serviço atende a trabalhadores e empresários das áreas de limpeza, asseio, conservação e facilities do Paraná. Em 2020, a unidade desenvolveu um trabalho voltado especialmente para o combate à pandemia de Covid-19 no setor. “Ao longo de todo o ano foram 10,8 mil exames clínicos e mais de 700 trabalhadores capacitados em treinamentos”, conta Maycon. O SESMT Coletivo Facop é o primeiro SESMT tripartite do país, resultado da união entre o sindicato patronal – Sindicato das Empresas de Asseio e Conservação (SEAC-PR) – e o laboral – Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio e Conservação de Curitiba (Siemaco Curitiba) -, com acompanhamento da Superintendência Regional do Trabalho no Paraná,Ministério do Trabalho.
Para Janete, esse tipo de organização pode contribuir significativamente para a melhora do quadro de saúde dos trabalhadores. “As doenças mentais podem ou não ter nexo causal com o trabalho, mas, independente disso, podem ser a porta de entrada para doenças ocupacionais ou acidentes de trabalho. Isso porque elas comprometem, além do sistema atencional, a resiliência para enfrentar as dificuldades do dia a dia, a motivação e a capacidade de reação”, afirma. A psicóloga ressalta que, quando se trata de melhorar a qualidade de vida dos profissionais, o apoio das empresas é indispensável.